Depois da demora...

A gente espera muito das pessoas.
As pessoas, por isso, acabam se acostumando a nada esperar da gente... e se acomodam.

A gente se acomoda por achar que não há nada melhor além do conforto monótono da mesma coisa sempre, ou por achar que deve alguma coisa a pessoas que afinal de contas não nos atribuem um valor qualitativo...

Digo isso porque aprendi com patadas que, na verdade, a gente só deve cabimentos mesmo aos nossos pais (e isso ninguém me tira da cabeça, porque quando fiz terapia era como se a psicóloga quisesse me fazer bobear nessa minha concepção... e sim - devo muito aos meus pais!), que gastaram de um tudo com a gente: dinheiro, tempo, paciência, emoções, desgostos e prazeres. Nossa conquista é deles tanto quanto nossos desastres. E eu que herdei a cabeça dura do meu pai e o apaziguamento da minha mãe, penso.

A gente coloca a culpa no tempo por não viver com as pessoas que queria, do jeito que queria, as horas que queria, por ter que priorizar o formalismo. E é tudo mentira quando alguém chega e diz "você deve fazer só aquilo que gosta". Tudo mentira. É impossível. Impossível. A gente coloca a culpa em outras pessoas por alguma jóia que tenha sumido, coloca a culpa nos pais por ser do jeito que é. Como diz em momento infeliz de auto-engrandecimento uma professora de bioética... "a necessidade de pôr a culpa de tudo em alguém vem de Eva"... como se fosse possível abordar Bioética de forma própria utilizando a Bíblia, mas tudo bem... vamos em frente...

A vida é uma caixinha de surpresas; no mundo há aproximadamente 6 bilhões de pessoas; não importa quão ruim seja a sua situação... ela tenderá sempre à piora; há uma chance enorme de que algo absolutamente fora do comum aconteça à gente todos os dias.

Na faculdade aprendi que nunca fui ninguém na verdade. Outro dia alguém me disse que o mundo não gira em torno de mim, embora eu tenha a certeza de que, assim como o meu mundo gira em torno de alguém, eu mesma também deveria ser o centro do mundo de alguém... pode não fazer sentido à primeira vista, mas pra mim faz completamente.

Não sou tão altruísta, não nasci pra cuidar de pessoas, especialmente se elas se encontram em situação de consciência, integridade física, mental e autonomia visivelmente inferior à minha. Mas passei 4 anos e meio aprendendo a lidar com situações do tipo, mesmo sabendo que isso na verdade não me rende engrandecimento pessoal no final de tudo. Gente, não rende.

A dor do próximo não pode e nem deve ser sentida por você que precisa manter o controle para restabelecer a ordem anterior ao caos... mas tudo tende ao caos, então, pra quê fazer força?

Tudo o que é limpo irá se sujar invariavelmente, mas criei o hábito de gostar de limpeza, mesmo sabendo que o branco da minha consciência nunca voltará ao que era há 4 anos atrás. Todo mundo tem uma sujeira debaixo do tapete. Ruim é quando a sujeira vira nódoa – não sai e incomoda. Até agora minhas sujeiras se limpam com anil.

A gente espera muito das pessoas... e elas não esperam tanto da gente...

A gente deve tudo aos pais – contas que nunca serão pagas; a gente se acomoda, aprende a amar a dor das patadas, come o pão amanhecido da rotina e dos desgostos, assume que a vida é curta para aproveitar tudo o que merece, percebe que realmente merece ser o centro do mundo de alguém, percebe que é cada um, um mundo. A gente põe a culpa de nossas faltas em tudo, porque foi condicionada a achar que tudo tem um bode expiatório, quando realmente a vida acontece aí por acontecer... a gente se esforça para sair do caos, porque não há ordem, porque é injusto organizar, partindo de um branco que há tempos não é mais branco, mas a tentativa de retirada de manchas com água sanitária e anil.

A gente é 8 ou 80... quando não sente dores da alma além das do corpo, sente a dor do outro como se fosse a sua própria, ou não sente nada. Cada um é uma formiga no meio de 6 bilhões, e sempre há algo mais a acontecer, há sempre alguém mais a nascer.

A gente espera muito das pessoas, e ainda assim não aprende a lidar com elas...